Diga-se o que se disser, a literatura "regional" será sempre, no Brasil ou em qualquer outro país, uma forma menor de literatura.
Wilson Martins
O fato de haver no Tocantins uma "vida literária" e uma certa produção não implica, necessariamente, na existência de uma Literatura Tocantinense, menos ainda numa Literatura Maior.
Na "República das Letras", aspectos geográficos, distritais, em síntese, "estadualismo artístico" é algo estranho. No fundo, consciente ou inconscientemente, trata-se de tentativa veladora do estético e de outras razões de ser da Literatura.
Em seus "Pontos de Vista" (Crítica Literária), mestre Martins é categórico: a geografia das letras, parte às vezes pitoresca, às vezes esclarecedora, às vezes inútil, da história literária, não se confunde com o estado estético da literatura.
Essa espécie nefasta de vale tudo, no qual critérios poéticos, estéticos, retóricos e críticos são lançados às favas, é intolerável. Francamente, basta escrevinhar, garatujar alguma bobagem, publicá-la por conta própria ou, pior ainda, às expensas de "organizações" alheias aos reais interesses literários para o sujeito logo se julgar escritor, poeta, contista e por aí vai (autor, que é coisa muito diferente de Escritor, qualquer um pode ser).
O caldo literário em exposição Tocantins afora entorpece a inteligência e o bom gosto, sobretudo, por estar sendo fabricado com provincianismo ridículo e raspas da magma regional descida à mediocridade e à estreiteza (e olha que há sujeitos se achando não só fundadores de uma tal de "literatura tocantinense" como da própria identidade).
Uma obra de caráter regional se localiza numa região, é óbvio, e nela mergulha nos gestos semânticos profundos multifacetados retirando, sim, as "substâncias reais". Apesar disto, não pode ser um fenômeno isolado (um exemplo bem pertinho de todos nós é "O Tronco", de Bernardo Elis, de 1956). Estou com Afrânio Coutinho: "O Regionalismo é um conjunto de retalhos que arma o todo nacional.
Muitos desses que se arrogam escritores e poetas tocantinenses chegam mesmo a acreditar que certas "igrejinhas' são suficientes para sacralizá-los. É deprimente e cômico esse espetáculo alimentado por conveniências e conivências.
A grande Arte nasce, conforme Flávio R. Kothe, da morte da circunstância que a gerou. Ela não se prende a um espaço e tempo, mas se define e se descobre ao ser capaz de superar aqueles que determinam a sua origem.
Destarte, se de todo não temos um simulacro nas artes de um modo geral, é quase certo que beiramos isso, tibe! Universalidade, parafraseando Martins, talvez consista no mais alto grau de qualidade literária aliada, sem dúvida, a um desejo profundo de interpretação do homem, problematizando nossa existência. Se houver, quem sabe um dia, uma Literatura Tocantinense (torço piamente para isto) será, sim, porque encontramos a maneira tocantinense de refletir o homem universal.
Ary Carlos Moura Cardoso
Mestre em Literatura pela UnB
Professor da UFT